Depois do sucesso da primeira edição, no ano passado, segmento volta ao Festival de Curitiba, e agora também fará transmissões online

Por Sandoval Matheus

O símbolo em Libras da Mostra Surda de Teatro. Foto: Annelize Tozetto.

“Teatro pra ouvintes tem muito, eu queria fazer algo voltado para os surdos, ajudar essas crianças a criar repertório.” A declaração foi dada por Lyvia Cruz, durante entrevista coletiva na manhã desta quinta-feira, 27, na Sala de Imprensa Ney Latorraca, no Hotel Mabu. A conversa com os veículos de comunicação aconteceu graças à tradução simultânea entre português e Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Atriz e palhaça, Lyvia vive em Fortaleza e integra quatro dos sete espetáculos – veja aqui a programação completa, a partir da página 42 do Guia 2025 – que estão na programação deste ano da Mostra Surda de Teatro, segmento do Festival de Curitiba que tem sessões nos dias 28, 29 e 30 março, no SESC da Esquina. Os ingressos são gratuitos, distribuídos uma hora antes de cada apresentação.

Todas as performances são bilíngues, em português e língua de sinais. “É pra vocês, ouvintes que não entendem Libras, não se preocuparem: vai ter acessibilidade pra vocês também”, brincou Gracy Kelly, também na escalação mostra.

Três espetáculos protagonizados por Lyvia – “A Astronauta Mara”, “A Chapeuzinho Azul” e a “A Palhaça Surda Mara” – são voltados ao público infantil, não sem motivo. “Vocês conhecem a história dos Três Porquinhos? Da Cinderela?”, questionou. “Na comunidade surda, muitas vezes as crianças, e até os adultos, não conhecem. Foi isso que me motivou a produzir arte. O conhecimento literário pra mim é muito valioso. A arte impacta a nossa vida, ajuda a entender tudo mais claramente.”

Para compor uma das montagens da grade, “Vozes Silenciadas”, voltada ao público adulto, a Flutuante Produção Cultural se dedicou a colher e dramatizar relatos de pessoas surdas do interior do Ceará, abordando temas como educação, emprego, exploração e discriminação. “É um espetáculo emocionante. Chega a doer de tanta emoção”, garantiu Lyvia. “Quando você assiste, entende o sofrimento familiar, emocional e até mesmo financeiro das pessoas.”

Depois do sucesso de 2024, quando a Mostra Surda aconteceu pela primeira vez, este ano duas peças serão gravadas e transmitidos online, na Rede Fringe, com o propósito de atingir um público mais amplo. Além de “Vozes Silenciadas”, a plataforma levará ao ar o Canto I da “Ilíada”, de Homero.

“A repercussão da primeira edição foi muito grande, e a agora tem até gente de fora do país vindo pra assistir. A gente recebe mensagens do Uruguai, dos Estados Unidos, da França”, confirmou Rafaela Hoebel, curadora.

“Nós queremos apresentar também a alegria surda, o corpo surdo. A mostra é uma mudança na paisagem social, que tem a oralidade como norte”, explicou Jonatas Medeiros, um dos coordenadores. “É preciso quebrar a ideia de que o surdo é um extraterrestre. As pessoas ficam nervosas quando encontram um surdo, porque não sabem se comunicar”, continuou ele. “A gente quer que a geração seguinte tenha mais proximidade e respeito. Essa é a mudança de mentalidade que estamos plantando hoje.”

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