Nos últimos quatro anos, a imprensa costuma dizer que o espetáculo Macacos é um monólogo em que o ator não está sozinho em cena. O autor, diretor e protagonista Clayton Nascimento aprova a expressão, mas faz questão de nomear quem são as pessoas que com ele contracenam na peça em cartaz na Mostra Lúcia Camargo em duas sessões, dias 4 e 5 de abril, às 20h30 no Sesc da Esquina.
Foi o que ele fez na manhã desta quarta-feira (4), na sala de Imprensa do festival do teatro no Hotel Mabu. “Quem está do meu lado são as mães que perdem filhos para violência do Estado. Simplesmente matam os filhos dessas mulheres e dizem ‘que pena, caso encerrado’ ”, disse. “Tem mãe que perde o filho e escreve numa cartolina Cadê Meu Filho e fica na frente do Tribunal de Justiça sozinha. Haja Força. Comecei a ouvir essas mães”, completou.
Dentre estas mulheres, há uma em especial, Terezinha Maria de Jesus, cujo encontro com Clayton é um caso sem precedentes de arte transformando a realidade social no Brasil. Terezinha é mãe do garoto Eduardo, que aos 9 anos foi morto na porta de casa, numa ação da polícia no Complexo do Alemão, no Rio de Janeiro, em 2015.
A história de Eduardo é uma das muitas que a peça conta para tratar da estruturação do racismo no Brasil, passando por diversos episódios de nossa história até chegar nas atuais estatísticas de jovens negros mortos pelas forças de segurança.
Desde que Terezinha autorizou Clayton a contar sua história no palco, os acontecimentos se precipitaram. Macacos foi acolhida pelo público. Aclamada e premiada pela crítica. Artistas e advogados começaram a ver a peça e pela primeira vez na história um caso é reaberto pela pressão popular que uma peça de teatro fez.
O maior prêmio de Macacos e um apelo
Clayton disse que após a reviravolta no caso, Terezinha olhou para ele e disse “comecei a ficar feliz”. “Eu olho para uma mulher dessa e entendo a força do teatro, a força do povo brasileiro e de suas histórias que são apagadas e enterradas, mas a gente precisa trazer para a luz com muita força.”
Aos jornalistas e influenciadores que acompanhavam a entrevista coletiva, Clayton fez um apelo. Eles não deveriam falar de sua atuação. Dos prêmio, das críticas positivas, dos recordes de público. Nada disso. “Evitem dizer que assistiram a uma peça legal ou provocativa. Digam sim que viram uma peça sobre uma mãe preta brasileira lutando contra o Estado”, disse.
Clayton acredita que se a Justiça for feita neste caso, abre-se um precedente no Brasil para todas as mães brasileiras invejam seus filhos assassinados em vão. “A vitória da Terezinha é a vitória de Macacos, muito mais do que qualquer prêmio que possa estar na minha mesa”.