A atriz Fabia Mirassos. Crédito: Annelize Tozetto.
A atriz e travesti Fabia Mirassos gosta das coisas ditas de maneira direta. Por isso, quando botou as mãos no monólogo “Vienen Por Mi”, um dos destaques da Mostra Solos do Festival de Curitiba, foi arrebatada. O texto, da escritora chilena e também travesti Claudia Rodrigues, fala das dores, dos amores e dos horrores que fazem parte da vida cotidiana de uma transexual.
Embora não deixe de ser um manifesto, é um texto cru, ao mesmo tempo poético e coloquial, sem rodeios, conceitos complicados ou palavras incompreensíveis, como os que hoje pipocam nas redes sociais. “Além de manifesto, ‘Vienen Por Mi’ é stand-up, poesia, risca-faca e deboche”, definiu a atriz durante entrevista coletiva na manhã desta quinta-feira, 30.
“A gente vive um momento muito teórico, cheio de textões e palavras bacanas. Eu não sou da geração lacração. Eu acho isso terrível, me irrita muito. Eu quero abertura, não quero passar a vida toda pregando dentro de uma bolha”, explicou.
“Hoje as pessoas basicamente dizem ‘cale a boca, deixa eu falar, esse é o meu lugar’. Eu acho que esse é o lugar de todo mundo. Como travesti, quero estar perto das pessoas, pra mostrar que a minha existência é natural.”
Pra se aproximar do público, em “Vienen Por Mi” a atriz não apenas interpreta um texto acessível e espontâneo: também cozinha. A decisão de preparar uma refeição durante a peça foi tomada em conjunto com a diretora Janaína Leite, que na primeira semana do Festival de Curitiba lotou por duas noites o Teatro Zé Maria com o controverso e radical “Stabat Mater”.
“Eu estou ali, no palco, com todo o meu amor travesti. E a comida é um ato de amor. Cozinhar é um ato de amor”, observa Fabia.
Se engana, no entanto, quem achar que Fabia Mirassos é forjada em compreensão e tolerância. Faz pouco tempo, em São Paulo, foi alertada por uma produtora de que era melhor deixar o Corpo de Bombeiros a postos durante suas apresentações. “Ela deu a entender que poderia haver algum incidente envolvendo alguém da plateia e as facas em cena. Não tinha pensado nisso.”
Muitos antes, aos 14 anos, Fabia já brigava na escola para ser chamada por seu nome social e poder usar o banheiro feminino.
Aos 17, foi expulsa de casa. Pós-epidemia de aids dos anos 80, a mãe acreditava que a filha não tinha outro futuro senão aquele. Uma previsão obviamente furada – pelo menos nesse caso. “Estou aqui falando com vocês, mas neste momento em algum lugar alguém como eu está apanhando ou morrendo.”
No Festival de Curitiba, quem for ver Fabia Mirassos no palco vai poder, ao final, provar a comida que ela prepara durante os 50 minutos da apresentação. “Fica, vai ter um petisquinho”, convida.
Serviço
“Vienen Por Mi”
Dia 31 de março, às 17h e às 22h
Na Casa Hoffmann
(Dr, Claudino dos Santos, 58 – São Francisco)
Classificação: 16
Duração: 50′
Ingressos: www.festivaldecuritiba.com.br e no Shopping Mueller (Piso L3)
Valores: R$ 50 e R$ 25 (meia)
Contém cenas de nudez
Por Sandoval Matheus – Agência de Notícias do Festival de Curitiba.